Quão importante é a técnica em qualquer atividade humana? Você faria uma cirurgia de alto risco com um cirurgião que nunca praticou? Compraria um apartamento em um edifício projetado por um engenheiro recém-formado, sem supervisão?
E na arte? O que é mais importante? A técnica ou o recado que o artista pretende passar?
E na fotografia?
A atuação de um cirurgião tem uma função muito bem definida: a cura. A do engenheiro construtor, prover a moradia, a estrada, a ponte ou o porto. Tais funções trazem consigo algo indissociável: o domínio da técnica. Sem ela o paciente morre ou o prédio desmorona. Não há desconstrução possível, muito pelo contrário, o aprimoramento das técnicas e tecnologias trazem consigo melhoras nos processos.
Feliz é o sociólogo, o artista plástico, o filósofo ou o músico, que podem testar, errar, voltar atrás, refazer, repensar. Principalmente nas atividades voltadas à arte, a criatividade e a busca por uma boa dose de pioneirismo, sem experimentação científica, são os motores propulsores dos indivíduos e esse é um dos processos mais lindos da mente humana na minha opinião.
No entanto, vivemos em uma época em que todo mundo quer ser dono de uma verdade, fortalecer um viés político ou simplesmente se enquadrar em algum grupo ideológico com pouco ou nenhum subsídio. Vamos em um caminho onde as pessoas querem fazer isso por meio da “arte” sem ter o embasamento técnico para tal. Sem estudo, sem prática, sem reflexão. Querem simplesmente aparecer. Reconhecimento com base em pó.
Sempre o cito quando entro nesse tipo de assunto: Picasso. Ele foi um pintor realista antes de desenvolver o cubismo. Não quis ser um Da Vinci. Desmontou o status quo das artes plásticas e criou seu próprio método. Entretanto, será que o estilo que o consagrou era desprovido de técnica? Obviamente que não, muito pelo contrário. Suas obras tinham um propósito, uma narrativa específica, inclusive pela própria opção estética, mas jamais prescindindo da técnica.
Vivemos uma época em que a sociedade é imediatista e preguiçosa. Todos querem parecer algo, mesmo que seja uma percepção muito volátil e temporária, mas quase ninguém quer ser de fato competente em algo. Dá trabalho. Precisa estudar. Converter o tempo ocioso utilizado em atividades inúteis e anestesiantes em algo produtivo. Jamais!
Na música, quantos jovens hoje topam estudar com disciplina um instrumento? Repetir fraseados intermináveis e exercícios enfadonhos na busca pelo aprimoramento da técnica? É muito mais fácil gravar qualquer barulho grotesco, com uma batida eletrônica padronizada, revestir a voz com um efeito robótico e corrigir a falta de técnica vocal e afinação em um software. É importante PARECER músico e não SER músico. Soma-se a isso um discurso de empoderamento ou identitário e está criada uma moda, uma forma de envernizar o emburrecimento ao invés de escancará-lo e investir no conhecimento.
Na fotografia não é diferente. Eu canso de ver trabalhos tecnicamente medonhos, premiados em seleções duvidosas, claramente por terem um apelo narrativo que está em alta, mas isso basta? Exceção à fotojornalismo, a narrativa é de fato mais importante do que a técnica? É para se pensar…
Eu sempre acho que colocar a técnica em segundo plano é dar a oportunidade para gente sem nenhum talento fazer qualquer coisa.