Ser ou Parecer?
No início do meu artigo passado critiquei o fato de ser muito comum a utilização de um nome novo para processos antigos, visando dar um ar de contemporaneidade às coisas.
Em função do enorme tráfego de informações que a vida moderna proporciona, aliado às bolhas criadas pelos algoritmos nas redes sociais, somos bombardeados o dia inteiro com conteúdos afins aos de nossos interesses. É nesse oceano da internet, que nunca sei se navegamos ou naufragamos, que aparecem as maiores atrocidades.
Da fotografia “opticossistêmica”, passando pela fotografia “afetiva” até chegar na fotografia “pictórica” é um festival de termos com nomes muito chamativos para o leigo, mas que mergulha num mar do ridículo para os que tem um mínimo de conhecimento formal sobre fotografia. Essa roupagem diferentona e espalhafatosa tem um único objetivo: vender cursos.
Não me entenda mal! Não existe nenhum problema em vender cursos. Eu adoro estudar e também adoro ganhar dinheiro! Viva o capitalismo. Entretanto, fico muito incomodado com os pseudo empreendedores que se investem da autoridade de especialistas em algo novo que, no entanto, já é feito há muito tempo. Pior do que isso: fazem sem ter a bagagem técnica e a experiência necessárias que os levem a ser bons professores, instrutores ou mentores.
É o mesmo lance do brigadeiro gourmet. O cara cobra caro, por algo que é feito há décadas, que já tem nome e processo produtivo amplamente conhecido. Não existe brigadeiro gourmet. Existe brigadeiro feito com ingredientes e processos ruins ou com ingredientes e processos bons. Não existe fotografia pictórica. Existem elementos do surrealismo aplicados à fotografia. Isso é mais velho do que andar pra frente.
Essas “técnicas de marketing”, que eu prefiro chamar de trapaça, com certeza atraem muitos indivíduos que buscam iniciar no mundo da fotografia, ou que estão dando seus primeiros passos e anseiam por mais conhecimento. No entanto, quando têm seus caminhos cruzados por picaretas, têm grandes chances de simplesmente se frustrar com os estudos e abandonar um processo de aprendizado e desenvolvimento que poderia ser incrível. Pronto! Lá se vai o próximo Ansel Adams para o ralo…
Se o problema todo fosse “apenas” esse, bastaria que nós, fotógrafos autônomos, fotoclubes ou coletivos, mantivéssemo-nos firmes no propósito de divulgar nossos trabalhos sérios e honestos, desconstruindo toda e qualquer picaretagem que aparecesse no meio.
Entretanto, meu grande receio é que somado ao fato de ser intrínseco a alguns exemplares da espécie humana tirar vantagem do seu próximo, pode ser que essa tendência seja retroalimentada pela superficialidade e efemeridade de boa parte das relações humanas atuais. Aparentemente, para muita gente é muito mais importante PARECER ser do que realmente SER. Seria uma simbiose difícil de combater.
Tomara que não!